A “lei da liberdade econômica” (lei 13.874/19) e os seus principais impactos para o Direito Civil – Primeira parte

Por Flávio TartuceApós intensos debates no âmbito do Congresso Nacional – e tendo a sua origem na medida provisória 881, 30 de abril de 2019 -, foi sancionada no último dia 20 de setembro a lei 13.874/19, denominada como “Lei da Liberdade Econômica”. Já publiquei, neste mesmo canal, dois artigos tratando da anterior medida provisória, em visão crítica, e fico feliz e honrado em notar que algumas das minhas considerações e sugestões desenvolvidas nesses textos anteriores foram adotadas na conversão do texto anterior em lei.

Cabe agora, então, analisar a norma emergente e seus principais impactos para o Direito Privado, com reflexões iniciais que podem ser eventualmente revistas e repensadas, após novos estudos e debates que devem surgir. Isso será feito novamente em textos separados, de forma pontual.

1. A vigência da Lei da Liberdade Econômica. Aplicação imediata?

Um primeiro aspecto a ser desenvolvido diz respeito à vigência da lei, o que envolve o seu art. 20. Nos termos do que foi aprovado no Congresso Nacional, o inciso I deste comando estabelecia que os arts. 6º a 19 – o que inclui as modificações do Código Civil – entrariam em vigor noventa dias após a sua publicação. Para as demais previsões da norma emergente, haveria a vigência imediata, a partir da publicação (inc. II do art. 20 da lei 13.874/19).

Porém, o inciso I do art. 20 foi vetado pelo presidente da República e passou a estabelecer: “Esta Lei entra em vigor: I – (VETADO); II – na data de sua publicação, para os demais artigos”. As razões do veto dizem respeito justamente à necessidade de todo o diploma ter vigência imediata, estando fundadas no interesse público: “A propositura legislativa, ao estabelecer o prazo de noventa dias para a entrada em vigor dos arts. 6º ao 19 do projeto de lei, contraria o interesse público por prorrogar em demasia a vigência de normas que já estão surtindo efeitos práticos na modernização do registro público de empresas, simplificação dos procedimentos e adoção de soluções tecnológicas para a redução da complexidade, fragmentação e duplicidade de informações, entre outros. Nestes termos, deve prevalecer a norma do inciso II do art. 20, que estabelece a vigência imediata do projeto de lei, na data de sua publicação”.

Todavia, a verdade é que o inciso II do art. 20 da lei da liberdade econômica ficou sem sentido, seja lógico ou jurídico, diante do uso da locução “para os demais artigos”. Não existem mais os citados “demais artigos” e também não há regra clara e inequívoca a respeito da vigência imediata da norma, afirmação que atinge todo o diploma emergente. Na verdade, houve um erro crasso no veto, e a solução pode ser o contrário do que ali se pretendeu. E nem se argumente que a “vontade do legislador” foi pela vigência imediata, uma vez que o que prevaleceu no Congresso Nacional foi o prazo de vacatio legis de noventa dias para os arts. 9º a 19.

Diante da ausência de norma específica a respeito da vigência, parece-me necessária e imperiosa a incidência do art. 1º, caput, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, in verbis: “Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada”. Sendo assim, toda a lei da liberdade econômica passa a ter vigência a partir de meados de novembro de 2019.

Essa posição é compartilhada por José Fernando Simão, Maurício Bunazar, Rodrigo Xavier Leonardo, Marco Aurélio Bezerra de Melo, Rodrigo Toscano de Brito, Marcos Jorge Catalan, Ricardo Calderón, João Ricardo Brandão Aguirre, Cesar Calo Peghini e Marcos Ehrhardt Júnior, em manifestações pessoais a este autor. Surge, portanto, a primeira polêmica decorrente da norma em questão, que pode ser resolvida caso o Congresso Nacional derrube esse veto.

2. O “problemático” art. 3º, inciso VIII, da MP 881 e sua correção no Congresso Nacional

Um dos dispositivos mais criticados da MP 881 era o inciso VIII do seu art. 3º, ao expressar que constituiria direito de toda pessoa, natural ou jurídica, essencial para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, observado o disposto no parágrafo único do art. 170 da Constituição Federal, “ter a garantia de que os negócios jurídicos empresariais serão objeto de livre estipulação das partes pactuantes, de forma a aplicar todas as regras de direito empresarial apenas de maneira subsidiária ao avençado, hipótese em que nenhuma norma de ordem pública dessa matéria será usada para beneficiar a parte que pactuou contra ela, exceto se para resguardar direitos tutelados pela administração pública ou de terceiros alheios ao contrato”.

Em suma, percebia-se uma valorização excessiva da vontade individual, o que afastaria até a possibilidade de alegação de normas de ordem pública de uma parte sobre a outra nos negócios jurídicos tidos como empresariais. A principal razão da crítica dizia respeito à constatação de que muitos desses negócios são de adesão, com conteúdo imposto por uma das partes e sem margem de negociação e estipulação do conteúdo da avença. Sabe-se que a grande maioria dos contratos civis enquadra-se nessas situações, inclusive alguns negócios empresariais, podendo ser citadas, apenas para ilustrar, a locação imobiliária não residencial, com intuito comercial; a locação em shopping center ou em centros de compras (de box); a representação comercial; a agência; a distribuição e a franquia. Como já apontávamos em nossos textos anteriores, por esse comando que constava da Medida Provisória, uma parte, inclusive o aderente, não poderia fazer uso de normas de ordem pública que poderiam lhe socorrer contra abusos contratuais praticados pelo outro negociante.

Tal problema foi muito bem observado na audiência pública realizada no Congresso Nacional em 21 de junho de 2019, para debate da conversão da MP em lei, pelo professor Rodrigo Xavier Leonardo, que citou o exemplo da inclusão de regra contratual relativa à prescrição diversa da lei, em afronta ao art. 192 do Código Civil, e que não poderia ser alegada pela parte que a introduziu.

Como também já anotávamos, se o objetivo da medida provisória foi o de tutelar o pequeno empresário, nesse ponto a projeção distanciava-se dos seus objetivos, pois poderiam prevalecer os interesses de grandes empresas perante os aderentes contratuais, por exemplo. Nota-se que a regra anterior não diferenciava contratos empresarias paritários e de adesão. Adotando essa nossa posição, o senador Rodrigo Pacheco sugeriu a supressão da regra, por meio da emenda 169, cujo texto principal era o seguinte:

“Suprima-se o inciso VIII do art. 3º da Medida Provisória n. 881, de 30 de abril de 2019. JUSTIFICAÇÃO. A Medida Provisória n. 811, de 2019, que institui a ‘Declaração de Direitos de Liberdade Econômica’, promove mudanças importantes no Direito Privado. Por isso, ela já despertou várias dúvidas e inquietações entre os mais respeitados juristas da contemporaneidade, caso de Anderson Schreiber, Flávio Tartuce, Marco Aurélio Bezerra de Melo e Pablo Stolze Gagliano. Além do mais, tivemos a oportunidade de ouvir o Professor Flávio Tartuce, que, após diálogo com outros dos maiores civilistas brasileiros da atualidade, apontou alguns aspectos técnicos e de mérito que estão a respaldar esta emenda e outras emendas que ora apresentamos”.

No total, foram vinte e três as emendas propostas pelo senador Pacheco, após ouvir as nossas sugestões. Sobre essa, especificamente, acabou por ser adotada outra solução, intermediária, qual seja a de um aperfeiçoamento legislativo, com um novo texto. Conforme a sua redação atual, muito melhor do que a anterior e contando com o meu apoio quanto ao seu objeto, constitui direito de toda pessoa, natural ou jurídica, para a concretização da liberdade econômica, “ter a garantia de que os negócios jurídicos empresariais paritários serão objeto de livre estipulação das partes pactuantes, de forma a aplicar todas as regras de direito empresarial apenas de maneira subsidiária ao avençado, exceto normas de ordem pública” (art. 3º, inc. VIII, da lei 13.874/19).

Pelo texto em vigor, uma excessiva valorização do clausulado e da força obrigatória da convenção passa a atingir expressamente os negócios empresariais paritários, o que já vinha ocorrendo no plano da jurisprudência superior. A exceção de proteção feita ao pacta sunt servanda diz respeito justamente a normas de ordem pública, que podem mitigá-lo ou relativizá-lo, o que há tempos é defendido por civilistas de gerações diversas, inclusive por este autor.

Em suma, se não houve a supressão total desse “problemático dispositivo”, pelo menos a sua redação ficou de acordo com a correta aplicação da ideia de autonomia privada, sem trazer grandes inovações com repercussões práticas diretas a respeito daquilo que se concebia anteriormente sobre esse importante princípio contratual.

3. Da desconsideração da personalidade jurídica. A retirada do dolo e a inclusão do novo art. 49 A no Código Civil

Sobre a desconsideração da personalidade jurídica, de início, nota-se a inclusão do art. 49-A no Código Civil pela lei  13.874/19, que não constava originalmente na MP 881 e com a seguinte redação:

“Art. 49-A. A pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores.

Parágrafo único. A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos.”

Pois bem, o caput do novo preceito é reprodução quase exata, mas com a mesma ideia no seu conteúdo, do art. 20, caput, do Código Civil de 1916, in verbis: “As pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros”. Sabe-se que o Código Civil de 2002 não reproduziu a norma com idêntico sentido, o que gerou debates nos anos iniciais da codificação a respeito da persistência ou não da ideia no ordenamento jurídico brasileiro.

Ao final acabou por prevalecer o entendimento de que o conteúdo do antigo art. 20 da revogada codificação ainda prevalece entre nós, pela própria concepção da pessoa jurídica como realidade técnica e orgânica. A desconsideração da personalidade jurídica, portanto, constitui uma exceção a essa regra consagradora da autonomia da pessoa jurídica em face de seus componentes. Por isso, o impacto prático dessa primeira previsão é também quase inexistente. Diz-se “quase”, pois a afirmação tem razão didática e metodológica tão somente.

O mesmo se pode afirmar quanto ao parágrafo único do novo comando do art. 49-A do Código Civil, ao prever que a autonomia da pessoa jurídica representa um mecanismo para a alocação de riscos, com o fim de estimular a economia e o desenvolvimento do país, pelo incremento de várias atividades. Afirmou-se novamente o óbvio, em texto que é mais “ideológico” do que efetivo, e com concreta relevância prática. O que agora está previsto na lei até pode trazer a falsa sensação de que a autonomia da pessoa jurídica frente aos seus membros não representava o que nele consta atualmente. Sempre foi – desde que se afirmou a pessoa jurídica como uma ficção legal dotada de realidade própria -, e sempre será assim. Em suma, a utilidade concreta de todo o novo comando novamente fica em dúvida.

Especificamente quanto ao art. 50 do Código Civil em vigor, passou a ter a seguinte redação, com a inclusão de um texto final no caput e de cinco novos parágrafos, frente ao texto original, em vigor no País desde janeiro de 2003:

“Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.

§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza.

§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por:

I – cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa;

II – transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e

III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.

§ 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica.

§ 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.

§ 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica”.

De início, a lei passou a viabilizar a desconsideração da personalidade jurídica – com a ampliação de responsabilidades – tão somente quanto ao sócio ou administrador que, direta ou indiretamente, for beneficiado pelo abuso. Há tempos defendo tal interpretação da norma, assim como outros juristas como Mário Luiz Delgado, para que o instituto da desconsideração não seja utilizado de forma desproporcional, abusiva e desmedida, atingindo pessoa natural que não tenha praticado o ato tido como abusivo ou ilícito. A título de exemplo, um sócio que não tenha tido qualquer benefício com a fraude praticada por outros membros da pessoa jurídica, seja de forma imediata ou mediata, não poderá ser responsabilizado por dívidas da empresa. Assim, neste primeiro aspecto, o texto emergente avança, e muito.

Os novos parágrafos, que foram incluídos, desde o texto da medida provisória, trazem critérios objetivos para a incidência da desconsideração nas relações entre civis, em prol de uma suposta certeza e segurança jurídica. Advirta-se que essa norma não se aplica à desconsideração da personalidade jurídica prevista em outros sistemas, como no Código de Defesa do Consumidor, na legislação ambiental (Lei 9.605/98) e na lei anticorrupção (Lei 12.846/13). Os dois critérios alternativos previstos no caput do art. 50 do CC/02 – precursores da chamada teoria maior da desconsideração – são o desvio de finalidade e a confusão patrimonial.

A respeito do desvio de finalidade, a norma passaria a estabelecer como requisito fundamental o elemento doloso ou intencional na prática da lesão ao direito de outrem ou de atos ilícitos, para que o instituto fosse aplicado. Como advertimos em textos anteriores, essa inovação representaria um grande retrocesso, travando a incidência da categoria, substancialmente por distanciar-se da teoria objetiva do abuso de direito, tratado pelo art. 187 do Código Civil, sem qualquer menção ao elemento subjetivo do dolo ou da culpa, e que fundamenta o instituto da desconsideração da personalidade jurídica.

Como antes sustentei, a MP 881 adotava um modelo subjetivo e agravado, pois somente o dolo e não a simples culpa geraria a configuração desse primeiro elemento da desconsideração. Argumentava-se, entre os defensores da norma, que o elemento doloso para a aplicação da desconsideração estava consolidado no âmbito da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o que não é verdade. Como é notório, a Corte tem exigido o dolo apenas para os casos de encerramento irregular das atividades, quando a empresa as encerra sem honrar com as suas obrigações e altera formalmente as informações perante os órgãos competentes (STJ, EREsp 1.306.553/SC, rel. ministra Maria Isabel Gallotti, segunda seção, julgado em 10/12/14, DJe 12/12/14).

Como defendi em texto anterior, a melhor redação do comando ficaria com a seguinte dicção: “Para fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza”. Isso acabou sendo sugerido por alguns parlamentares, caso do deputado André Figueiredo, por meio da emenda 90: “suprima-se a expressão ‘dolosa’ do § 1º do art. 50 da lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil, alterado pelo art. 7º da MPV 881, de 2019”.

Como acrescentei em outro texto que escrevi, grandes e até insuperáveis seriam os entraves para a incidência da desconsideração da personalidade jurídica – sobretudo na sua modalidade inversa – no âmbito do Direito de Família e das Sucessões, para os quais tem aplicação o art. 50 do Código Civil. Importante sempre lembrar que o elemento subjetivo, notadamente a culpa, foi afastado em demandas relativas a esses ramos jurídicos nos últimos anos, e a MP 881 trazia a volta de sua análise para a desconsideração, especialmente do dolo.

Sobre a confusão patrimonial, foram mantidos os parâmetros objetivos que estavam previstos na MP. 881, sem qualquer modificação, a saber: a) o cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; b) a transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e c) outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. Somente quanto à primeira previsão tinha a minha ressalva, e sugeri que fosse retirada a palavra “repetitivo”, pois a confusão patrimonial poderia estar configurada por um único cumprimento obrigacional da pessoa jurídica em relação aos seus membros; por um ato isolado, é possível realizar um total esvaziamento patrimonial com o intuito de prejudicar credores. De todo modo, tal entendimento não foi adotado, e caberá à jurisprudência fazer a mitigação do texto legal, se for o caso, nessas situações.

Sobre o § 3º do art. 50, continuo a entender que seria mais interessante adaptá-lo ao art. 133, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015, que, ao tratar do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, estabelece que “aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica”. A redação que consta da nova lei, confirmando a medida provisória anterior, ao prever que “o disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica”, pode até trazer a falsa impressão de que não se trata da desconsideração inversa. De todo modo, como foi essa a opção do legislador, é preciso sempre afirmar que se trata dos mesmos institutos.

Quanto ao § 4º do art. 50, reitero o meu apoio ao texto legislativo, ao preceituar que “a mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica”. Foi positivada, portanto, a viabilidade jurídica do uso da desconsideração da personalidade jurídica para atingir outra pessoa jurídica, o que se denomina como desconsideração econômica, indireta ou sucessão entre empresas.

Como última mudança do art. 50 do Código Civil, o seu § 5º confirma o texto da MP, no sentido de que não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica. Lamenta-se a manutenção a respeito da alteração da finalidade original, que deveria ter sido retirada do texto de conversão, o que foi proposto pelo senador Pacheco, por meio da emenda 173.

Assim como em textos anteriores, cito mais uma vez o exemplo de uma fundação, que pode ter a sua autonomia desconsiderada, com o fim de responsabilização dos seus administradores, caso altere a sua finalidade inicial com o objetivo de se desviar de seus fins nobres, constantes do art. 62, parágrafo único, do Código Civil. Nessa hipótese, defendo que já há motivo para aplicar o instituto do art. 50 do Código Civil, o que novamente deve ser considerado pela jurisprudência, abrindo-se uma exceção ao texto legal.

Como palavras finais, entre erros e acertos, penso que o texto da lei a respeito da desconsideração da personalidade jurídica é bem melhor do que o original e também do que constava da medida provisória, em especial pela retirada do dolo, tendo o Parlamento Brasileiro cumprido o seu papel e a sua função nos debates que permearam a conversão da MP e no aperfeiçoamento do texto.

No próximo artigo tratarei das alterações relativas aos contratos, especialmente as modificações nos arts. 113 e 421 do Código Civil e o novo art. 421-A, que foi introduzido na codificação privada em vigor.

Flávio Tartuce
Professor, autor, consultor jurídico e parecerista. Doutor e Pós-Doutorando em Direito Civil pela USP. Presidente do IBDCONT
Artigos criados 10

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Artigos relacionados

Digite acima o seu termo de pesquisa e prima Enter para pesquisar. Prima ESC para cancelar.

Voltar ao topo